Tubarão (1975)
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Tubarão (1975)

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Tubarão não é apenas um clássico. É considerado (junto com Guerra nas Estrelas) o precursor dos blockbusters, o primeiro arrasa quarteirão da história do cinema. E quem não se borrou de medo de entrar na água depois de assisti-lo nos cinemas ou, mais tarde, na televisão, quando o filme começou a ser exibido e reprisado à exaustão, junto com suas continuações toscas?!

Relendo o livro de Peter Benchley (leitura de adolescente da qual me lembrava pouco), redescobri um filme muito próximo do romance, o que pode ser facilmente explicado pelo fato de que o próprio autor roteirizou a obra. Benchley explica nas notas iniciais das edições posteriores a 2005 (a minha é uma brochura bem bacana lançada pela DarkSide em 2015) que os produtores David Brown e Richard D. Zanuck fizeram apenas uma exigência em seu trabalho: Tubarão, o filme, seria uma aventura, um filme de ação de A a Z – sendo assim, ele deveria cortar toda e qualquer menção a romance (extraconjugal de Ellen Brody) ou à máfia – o que não acrescentaria nada à história, de qualquer forma.

A produção de Jaws (“Mandíbulas”, na tradução literal) teve centenas de problemas e o orçamento inicial de 4 Milhões extrapolou os 9 Milhões. O robô mecatrônico do tubarão (que Spielberg chamava carinhosamente de “Bruce”, em homenagem a seu advogado) era tão sem jeito e tão problemático que em várias cenas o diretor optou por insinuar sua presença, ao invés de mostrá-lo, substituindo sua presença com a câmera rodando do ponto de vista do predador.


Essa “gambiarra cinematográfica” resultou em centenas de elogios à produção, como se ela tivesse sido pensada, desde o início, daquela maneira, por ter criado um clima de tensão muito mais forte e enervante que se o animal tivesse sido mostrado. Anos depois, Sam Raimi faria algo parecido com seu filme de estreia, “Evil Dead”, de 1981, com a câmera passeando como um predador pelo meio de uma mata sinistra, nos arredores da cabana onde seus pobres personagens encontram o Necronomicon.


Outro problema na produção de Tubarão eram as constantes discussões entre Richard Dreyfuss (que viveu o oceanógrafo Matt Hooper) e Robert Shaw (Quint, o caçador de tubarões). Mais de uma vez essa pendenga entre os atores serviu para potencializar o clima entre os personagens e favorecer o filme como um efeito colateral imprevisto.


Mas o fato é que o veterano Shaw tinha tantos problemas com bebida que destruiu completamente as cenas em que conta a história de naufrágio de seu personagem Quint e de como seus companheiros haviam morrido, um a um, a seu lado, atacados por tubarões. Mas pediu uma nova chance para Spielberg no dia seguinte e a cena que vemos no filme é uma das mais impressionantes de sua carreira.

Com todos os problemas, Tubarão faturou 470 Milhões de dólares com a história do xerife de uma pequena ilha turística que precisa caçar um tubarão branco de sete metros de comprimento. O demônio do mar, bicharoco carniceiro, começa a matar logo de início, atraído por uma banhista hippie que nada nua numa madrugada quente. Os restos de seu corpo são encontrados no dia seguinte e o pânico se inicia.


Inicialmente, as autoridades acusam o xerife de estar criando piolho na cabeça do ovo e destruindo a economia da cidade, toda voltada para o turismo. A icônica cena da praia, onde os banhistas permanecem na areia, receosos de entrar na água, é um marco do suspense realista; poderia ser vivida por mim ou por você, numas férias nervosas em qualquer balneário paradisíaco – duvido que metade da areia não ficaria com o pé fincado no continente, longe até das espumas, se alguém tivesse sugerido uma morte por ataque de tubarão naquela semana.


De qualquer forma, é claro que as mortes recomeçam e a presença do tubarão passa a ser uma ameaça real, reconhecida por todos, temida e disputada como um troféu.


Brody consegue a ajuda de um oceanógrafo e, mais tarde, de um caçador de tubarões experiente e algo soturno, com ares de capitão Ahab perseguindo Moby Dick. É nesse ponto que o filme deixa de lado qualquer drama provinciano e passa a acompanhar a caçada ao tubarão: épica!


A música de John Williams é uma obra à parte e icônica como o filme. Perfeita e assustadora! E o engraçado é que Spielberg riu e zombou quando a ouviu pela primeira vez, dizendo a Williams que era engraçada:


– Mas o que você realmente pensa em fazer para o filme? – o diretor perguntou.


Mais tarde, reconheceu que, sem a música emblemática criada pelo maestro, Tubarão talvez tivesse sido apenas metade do filme que foi. É tão emblemática que pode ser colocada no topo das melhores trilhas de suspense já compostas, ao lado de Psicose.

Por outro lado, é claro que, visto hoje, Tubarão sofre da carência dos efeitos especiais modernosos, mas nenhum outro filme do gênero teve o impacto ou sequer chega próximo ao desespero e suspense criados por Steven Spielberg. Uma obra de arte com Roy Scheider, Robert Shaw e Richard Dreyfuss – que estrelaria o filme seguinte de Spielberg (Contatos Imediatos do Terceiro Grau).

Para rever a cada 10 anos! Ou cada vez que algum diretor mambembe e vagabundo decide fazer outro filme de tubarões, calcado só nos efeitos especiais de CGI, mas sem uma boa história para ampará-lo. Minha tia Vili (a mesma que me salvava das havaianas voadoras da minha mãe e que me levou ao cinema pela primeira vez, para ver Os Trapalhões) já havia assistido ao filme no cinema e me serviu como um trailer bem preparado quando finalmente pude assistir na televisão. Mas me lembro perfeitamente que Tubarão só me rendeu um susto. Um único e inequívoco susto, quando Matt Hooper (Richard Dreyfuss) encontra um enorme dente no casco de uma traineira semi-naufragada. Do rombo no casco surge um corpo meio devorado e eu me borrei no sofá.


No geral, Tubarão é um filme que traz outro tipo de tensão: medo contínuo e não picos de espanto ou susto. É um thriller tão bem construído e com um clímax tão perfeito e apoteótico que serviria para mudar a forma com que os roteiristas passariam a tratar o embate definitivo – a provação final na jornada dos corajosos heróis à caça do mecatrônico Bruce.



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