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Entre Leões e Impérios: Allan Quatermain e o Preço da Aventura

  • Foto do escritor: Jefferson Sarmento
    Jefferson Sarmento
  • 5 de mai.
  • 4 min de leitura

Atualizado: 6 de mai.

Aventura, coragem e crítica: Allan Quatermain encara a selva — e nós, a história por trás da ficção de Haggard.


H. Rider Haggard e seu personagem
Haggard e sua craição: Quatermain, o Caçador.

Em um tempo em que o mapa do mundo ainda guardava mistérios em seus cantos mais remotos e a África pulsava com o ritmo inexplorado de seu coração selvagem, um nome ecoava entre os aventureiros e contadores de histórias: Allan Quatermain. Criado pela pena exploradora de H. Rider Haggard, o caçador inglês não é apenas um personagem, mas a própria personificação do espírito indomável da aventura, um farol a guiar leitores através de selvas densas, ruínas ancestrais e os segredos sussurrados pelo vento nas savanas infinitas.


Henry Rider Haggard teve sua vida entrelaçada intimamente com a tapeçaria rica e complexa da África do Sul. Imortalizou em suas narrativas a vastidão e o mistério daquele continente. Suas experiências, desde os embates com a cultura Zulu até a contemplação da paisagem imponente, transbordam de suas páginas, conferindo uma autenticidade visceral aos seus mundos ficcionais. Em meio a essa tapeçaria exótica, Allan Quatermain emergiu como um guia outrora confiável, um rosto familiar ao leitor médio inglês em terras desconhecidas.


Ilustração do conto "Contra todas as possibilidades".
Ilustração original do conto.

Contudo, ao revisitarmos hoje a obra de Haggard e a figura de Quatermain, é crucial lançar um olhar crítico sobre o contexto histórico em que foram concebidos. Haggard, inserido na era do imperialismo britânico, inevitavelmente imbuía suas narrativas com as visões e os preconceitos da época. Allan Quatermain, embora apresentado como um homem de certa integridade e conhecimento, também reflete essa perspectiva. Sua própria existência como um explorador e caçador europeu na África está intrinsecamente ligada à lógica da colonização e à exploração de terras e recursos.


Em suas aventuras, podemos identificar traços de uma visão eurocêntrica, com a cultura e os valores ocidentais frequentemente colocados como superiores. As representações dos povos nativos, embora por vezes admiráveis em certos aspectos, podem também carregar estereótipos e simplificações que refletem as atitudes da época. Essa dualidade é inerente à obra: celebramos o espírito aventureiro de Quatermain, as histórias empolgantes... mas não podemos ignorar o pano de fundo de um período histórico marcado pela dominação e pela desigualdade.

Até que ponto essa herança histórica e esses preconceitos perceptíveis hoje em suas linhas afetam nossa leitura e apreciação da figura do aventureiro? É uma questão complexa e que convida à reflexão. Podemos admirar a bravura e a resiliência de Quatermain em face do desconhecido, reconhecendo, ao mesmo tempo, que ele é um produto de seu tempo, com todas as limitações e vieses que isso implica.

Clique na imagem para conhecer a Fantástica Aventura

A própria imagem do aventureiro romântico, desbravando terras inexploradas, precisa ser confrontada com a realidade histórica do impacto do colonialismo sobre as culturas e os territórios explorados. A busca pela aventura, muitas vezes, estava interligada à expansão imperial e à exploração de recursos naturais, com consequências profundas e duradouras para os povos nativos.


É nesse ponto de tensão que reside uma oportunidade de aprendizado e de um engajamento mais profundo com a literatura do passado. Ao reconhecermos as complexidades e as contradições presentes na obra de Haggard e na figura de Allan Quatermain, podemos ter uma compreensão mais rica e matizada tanto da história da literatura de aventura quanto do contexto histórico que a moldou.


Sendo assim, é com entusiasmo aventuresco e tendência à análise da literatura pulp (e mesmo aquelas que influenciaram o tipo de histórias publicadas em revistas como A Adventure, a Short Stories e outras) que a Editora Tramatura resgata um fragmento desse universo fascinante e complexo em nossa primeira edição de Fantástica Aventura, com o conto “Contra todas as possibilidades”, de Haggard. Numa narrativa concisa e tensa, somos convidados a testemunhar a crueza do confronto entre o homem e a natureza selvagem através dos olhos de Quatermain. O título, por si só, já prenuncia os desafios monumentais e as chances incertas que um caçador como ele enfrenta diariamente.


Haggard nos transporta para um momento específico, um instante de perigo visceral onde a astúcia, o instinto e a coragem são as únicas armas contra as forças implacáveis da vida selvagem. Através da voz de Quatermain, somos imersos na tensão palpável do encontro, nas decisões cruciais tomadas sob pressão e nas reflexões que emergem da experiência de confrontar a própria mortalidade.


Convidamos vocês, leitores da Tramatura, a conhecerem a Fantástica Aventura, a se aventurarem pelas páginas de “Contra todas as possibilidades”, mas com uma perspectiva crítica em mente. Apreciem a narrativa envolvente e a figura icônica de Allan Quatermain, mas também ponderem sobre as sombras do imperialismo que inevitavelmente acompanham essa jornada. Tirem suas próprias conclusões sobre como essa herança molda nossa visão do aventureiro e sobre a importância de um olhar crítico ao revisitarmos os clássicos da literatura.


A aventura é fascinante, mas a reflexão sobre seus valores e contextos é essencial.


Porque ler Haggard hoje não é apenas buscar o fascínio da aventura clássica — é também enfrentar os ecos de um tempo que moldou a ideia de "civilização" e "selvageria".


Fantástica Aventura #001 não convida apenas à leitura — convida à reflexão. E a Travessia começa com Allan Quatermain, entre dentes de leão e dilemas de um passado que ainda rugem nas entrelinhas.


Assista ao vídeo com a análise sobre Haggard e Quatermain lá no nosso canal do Youtube.

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