Dia das mães: salvação e sombras em personagens inesquecíveis
- Tramatura
- há 3 dias
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Um tributo às mães do terror, do suspense e da ficção científica

Neste domingo, em vez das flores costumeiras e do café na cama, que tal prestar homenagem às mães mais intensas da ficção? Esqueça os comerciais de margarina — estamos falando daquelas que enfrentam o diabo (às vezes literalmente), que perdem filhos, que os matam, que morrem por eles ou por causa deles. Mães de mundos em ruínas, de casas mal-assombradas, de galáxias infestadas de horrores. Algumas são faróis na escuridão, outras são a própria treva. Mas todas, sem exceção, merecem ser lembradas — ou temidas.
Dê uma espiada na nossalista e acrescente aquela que você acha que esquecemos...
Chris MacNeil

Talvez seja o retrato mais pungente da impotência materna diante do inexplicável. Em O Exorcista, tanto no romance de William Peter Blatty quanto no filme de William Friedkin, ela é uma atriz famosa, liberal, inteligente, que vê sua filha, Regan, se transformar lentamente num receptáculo do inferno. O mais angustiante em Chris não é o quanto ela sofre, mas o quanto ela tenta não perder o controle. Não entende o que acontece, mas também não se rende ao desespero. Busca médicos, psiquiatras, padres. E quando tudo falha, sobra a fé — não necessariamente em Deus, mas naquilo que uma mãe tem de mais sagrado e simples: a recusa em abandonar seu filho.
Margaret White

Por outro lado, a mãe de Carrie White jamais permitiria que um padre exorcizasse sua filha. Stephen King nos apresenta uma mulher que, ela mesma, se vê como instrumento divino. Viúva, isolada, mergulhada num fanatismo que beira a loucura, Margaret acredita que tudo é pecado — inclusive a puberdade. Quando Carrie menstrua pela primeira vez, a mãe não oferece acolhimento, mas castigo. Sua obsessão com o “mal” que habita a filha termina por alimentá-lo. Nos filmes, tanto o de 1976 quanto o de 2013, ela aparece como figura trágica e monstruosa. Ama, sim — mas seu amor é uma lâmina afiada, disfarçada de cruz.
Wendy Torrance

Wendy não é uma heroína clássica. À primeira vista, parece frágil, hesitante, talvez até passiva. Mas é justamente nessa aparência que reside sua força. Em O Iluminado, Wendy é a mulher que acompanha o marido, Jack, e o filho, Danny, ao isolado Hotel Overlook, acreditando que finalmente terão uma chance de recomeçar. O que encontra, no entanto, é a lenta corrosão da sanidade de Jack e a presença sobrenatural do hotel. No romance de King, Wendy tem mais agência do que na célebre adaptação de Stanley Kubrick, onde Shelley Duvall oferece uma interpretação nervosa e angustiada. Mas em ambas versões, ela se revela resistente, feroz quando necessário. Sua luta não é grandiosa — é silenciosa, mas inabalável.
Sarah Connor

Sarah começa como coadjuvante de uma história que não compreende. Em O Exterminador do Futuro (1984), ela é apenas uma jovem garçonete tentando sobreviver a uma noite estranha. Mas ao longo dos filmes, transforma-se em uma figura mítica. Destinada a dar à luz o salvador da humanidade, Sarah recusa ser apenas um útero simbólico. Treina, luta, enlouquece. Em O Exterminador do Futuro 2, Linda Hamilton retorna como um furacão de músculos, paranoia e amor incondicional. Sarah é mãe de um futuro, mas também de uma ideia: a maternidade como resistência contra o fim do mundo.
Ellen Ripley

Ripley é mãe, mas nós não a enxergamos assim desde o princípio. Em Alien, o Oitavo Passageiro, é a oficial racional e pragmática que sobrevive onde todos os outros falham. Mas em Aliens – O Resgate, de James Cameron, descobrimos que Ripley perdeu a própria filha durante sua hibernação espacial. Esse luto silencioso ganha forma na figura de Newt, a garotinha órfã que ela resgata. A relação entre as duas cresce como raiz em solo queimado. Ripley enfrenta hordas alienígenas, soldados incompetentes e a Rainha Alien — outra mãe, monstruosa, protetora e imparável. O duelo entre elas é épico porque carrega um subtexto profundo: quando duas mães entram em guerra, o universo assiste em silêncio.
Pamela Voorhees

A mãe de Jason é presença fantasmagórica e carnal. Em Sexta-feira 13, ela é a mãe do menino que morreu afogado porque os monitores estavam ocupados demais com suas aventuras adolescentes. A vingança de Pamela não é apenas simbólica: ela mata um a um os novos ocupantes do acampamento, como se reencenasse eternamente o momento da perda. Não usa máscara de hóquei. Não tem poderes. É apenas uma mulher de luto absoluto, transformada em arma. O filho voltará nos filmes seguintes — mas ela foi a primeira Voorhees a nos mostrar que o amor de mãe pode ser letal como um facão afiado.
Grace Stewart

A protagonista de Os Outros vive num casarão envolto em brumas e silêncio. Seus filhos têm uma estranha condição: não podem ser expostos à luz do sol. O marido desapareceu na guerra. E ela, sozinha, impõe regras rigorosas, quase sufocantes. Nicole Kidman interpreta Grace com uma contenção angustiada, uma mistura de rigidez e fragilidade que só se compreende de verdade quando a revelação final do filme acontece. Grace é mãe zelosa, severa, perdida. E como muitas mães do gênero gótico, seu amor é um eco que atravessa paredes e segredos.
Rose Da Silva

Em Terror em Silent Hill, Rose não aceita a ideia de perder a filha. Quando a menina desaparece em direção à cidade fantasma, a mãe a segue — e descobre um mundo onde o pecado se materializa em ferrugem, monstros e gritos. A maternidade aqui é motor da narrativa: Rose é Orfeu em busca de Eurídice, mas não olha para trás. Enfrenta enfermeiras cegas, fanáticos religiosos e verdades incômodas. Sua jornada é uma dança entre o instinto e o abismo. A cada passo, repete para si: minha filha, minha filha, minha filha.
Rachel Keller

Em O Chamado, é jornalista e mãe. Duas funções que, quando misturadas, criam um tipo muito específico de heroína. Seu filho, Aidan, assiste a uma fita amaldiçoada que promete a morte em sete dias. O tempo começa a correr. Rachel investiga com o rigor de uma profissional, mas também com a urgência de quem está diante do precipício. Naomi Watts dá a ela uma serenidade tensa, uma determinação fria como a água do poço que será o centro do horror. Rachel não se dobra. Mas ao fim, entende que nem todo mal pode ser exorcizado — às vezes... só se transfere.
Annie Wilkes

Eu sei, você deve estar estranho esta, afinal Annie Wilkes não tem filhos — pelo menos não de sangue. Mas em Misery, também de Stephen King, age como uma mãe perversa com o escritor Paul Sheldon, que ela sequestra após um acidente. Annie alimenta, cuida, conversa, mas também ameaça, tortura, mutila. Sua relação com ele é a de uma mãe decepcionada com um filho ingrato. O passado de Annie é sombrio e as pistas que encontramos sugerem que sua visão de cuidado sempre foi turva. Ela representa a maternidade como controle absoluto... e descontrolada. E sua casa é um útero do qual não se escapa.
Norma Bates


Ela está morta. Mesmo assim, vive. Em Psicose, ela habita a mente do filho como uma entidade onipresente. Norman conversa com ela, veste suas roupas, reproduz suas falas. No romance de Robert Bloch, ela é símbolo de uma maternidade invasiva e sufocante. No cinema, sob a direção de Hitchcock, torna-se ainda mais poderosa na ausência — uma sombra em forma de voz, um perfume de morte que nunca desaparece. Norma é a mãe que nunca soube partir. E talvez nunca tenha querido.
A Rainha Alien

Você pensou que ela seria apenas uma citação quando falamos de Ellen Ripley... Mas precisamos falar dela. Em Aliens, é puro instinto. Não tem nome, fala ou rosto humano. Mas é mãe. Defende seus ovos com fúria, reage com violência a qualquer ameaça, e jamais recua. Quando encontra Ripley, outra mãe disposta a tudo por sua filha adotiva, o confronto transcende a ação. É uma batalha entre arquétipos. A maternidade como impulso biológico versus a maternidade como escolha e sacrifício. Nenhuma das duas cede. Porque mães, em qualquer canto da galáxia, lutam até o fim.
Rosemary Woodhouse

Rosemary é, talvez, a figura mais trágica desta lista. Em O Bebê de Rosemary, de Ira Levin, ela é manipulada por todos à sua volta: o marido, os vizinhos, os médicos. Engravidada por uma entidade demoníaca, perde o controle sobre o próprio corpo e mente. A gravidez, que deveria ser um momento de plenitude, revela-se um pesadelo infernal. Mas no final, quando segura o bebê nos braços, algo acontece. Rosemary hesita. Depois balança o berço. Um gesto ambíguo, terrível, e profundamente humano. Porque o que faz uma mãe, afinal, senão amar mesmo quando tudo está errado?
Nicole de Albuquerque
Talvez seja a mais indecifrável entre essas mães. Em Terra de Almas Perdidas, ela aparece como uma figura quase mítica na Enseada dos Novenos — um lugar onde as histórias nascem tortas, sussurradas em voz baixa, sempre misturando o real com o impossível. Nicole tem mais de setenta, talvez oitenta anos. Mas está grávida. E não de um bebê comum. Os habitantes da Enseada dizem que ela carrega em si um novo cramulhão da garrafa — o mesmo tipo de entidade demoníaca que pertenceu a seu pai, Fausto, o homem que nunca morria, o homem da garrafa com o diabo dentro. Nicole sempre quis o que era de Fausto. Não o amor, não o legado — apenas o poder. Quando ele desaparece, levando consigo o segredo do pacto e o próprio demônio engarrafado, Nicole parece tomada por uma urgência ancestral. Agora ela está grávida, mesmo tão envelhecida (ou talvez não esteja tão envelhecida, mas isso é impossível, como tudo mais é), avança pelas páginas do livro como uma assombração de olhos vivos. Ela fez um pacto? Ou foi outra coisa? O certo é que, naquela terra de ecos e lendas, Nicole de Albuquerque não gestava apenas uma criança — mas uma promessa de continuidade do mal. E o mais perturbador: parecia feliz com isso. Uma mãe que deseja o nascimento do inferno, porque acredita que é dele que vem a verdadeira herança.
...
Mães de sangue, de alma, de luto ou de fúria. Umas salvam, outras destroem. Todas deixam marcas. Que este domingo seja também delas — as que nos assombram. As que nos salvam. As que continuam amando mesmo depois do fim.
Ou além dele.
Excelente artigo! Só personagens marcantes da cultura Sci-Fi e de Terror.